STF divulga acórdão sobre o julgamento das ADI’s 2028, 2036, 2621 e 2228
STF divulga Acórdão sobre o julgamento das ADI’s 2028, 2036, 2621 e 2228
Em 08/05/17 foi publicado no sítio eletrônico do STF, o acórdão lavrado nos autos das ADI’s 2028, 2036, 2621 e 2228. Nestas ações, hospitais, entidades da área da saúde e educação questionam exigências previstas por leis ordinárias, in casu, no artigo 55 da Lei 8.212/1991 e suas alterações e na Lei 9.732/1998 que tinham por finalidade impor condições muito restritivas para que tais entidades usufruíssem da imunidade das contribuições sociais.
A tese fixada pelo Tribunal foi a de que “os requisitos para o gozo da imunidade hão de estar previstos em lei complementar”. Isto porque, segundo a maioria dos Ministros, por força do artigo 146, II, da Constituição República , somente lei complementar pode prever exigências para que entidades beneficentes de assistência social gozem da imunidade tributária em relação a contribuições sociais.
Partindo dessa premissa, o posicionamento do STF foi no sentido de declarar inconstitucionais as exigências neste sentido previstas em leis ordinárias.
Concretamente, o que se tem como reconhecidamente inconstitucional – para fins de usufruto de imunidade – é:
1 – a exigência de promoção, gratuita e em caráter exclusivo, a assistência social beneficente a pessoas carentes, em especial a crianças, adolescentes, idosos e portadores de deficiência, bem como a oferta e a efetiva prestação de serviços de pelo menos sessenta por cento ao Sistema Único de Saúde;
2 – o entendimento de que assistência social beneficente é a prestação gratuita de benefícios e serviços a quem dela necessitar.
3 – a possibilidade de cancelamento da imunidade se verificado o descumprimento das condições dispostas neste artigo
4 – A proporcionalidade da imunidade às entidades sem fins lucrativos educacionais e as que atendam ao Sistema Único de Saúde, mas não pratiquem de forma exclusiva e gratuita atendimento a pessoas carentes, baseada no valor das vagas cedidas, integral e gratuitamente, a carentes e do valor do atendimento à saúde de caráter assistencial.
Tendo em vista a aposentadoria do Ministro Joaquim Barbosa, relator inicialmente designado, mas que chegou a proferir o seu voto, coube à Ministra Rosa Weber a tarefa de lavrar o acórdão. Assentou, a Ministra que, no mérito, por unanimidade e nos termos do voto do Ministro Teori Zavascki o Tribunal julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 9.732/1998, na parte em que alterou a redação do art. 55, inciso III, da Lei nº 8.212/1991 e acrescentou-lhe os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º da Lei nº 9.732/1998. Sua Excelência asseverou, também, que o voto do Ministro Teori Zavaski inaugurou uma divergência em relação ao voto do relator originário o Ministro Joaquim Barbosa.
É fundamental que se busque aclarar alguns aspectos da decisão, isto pelo fato de que consta do acórdão a afirmação de que a unanimidade se baseou no voto do Ministro Teori Zavaski. Entretanto, o voto do Ministro Teori foi proferido após o voto do Relator, Ministro Joaquim Barbosa que tendo se aposentado, não pode se manifestar sobre o entendimento do Ministro Teori.
Ocorre que o Ministro Joaquim Barbosa julgou “parcialmente procedentes as ações diretas de inconstitucionalidade, confirmando a medida liminar, para reconhecer a inconstitucionalidade do art. 1º, na parte em que alterou a redação do art. 55, inciso III, da Lei nº 8.212, de 24/7/1991, e acrescentou-lhe os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º, da Lei nº 9.732, de 11/12/1998”. Declarou, ainda, expressamente “inconstitucionais o art. 55, II da Lei 8.212/1991, tanto em sua redação original, como na redação dada pela Lei 9.429/1996, o art. 18, III e IV, da Lei 8.742/1993, do art. 2º, IV, 3º, VI, §§ 1º e 4º e par. ún., do Decreto 2.536/1998 e dos arts. 1º, IV, 2º, IV, §§ 3º e 7º, § 4º, do Decreto 752/1993.”
O Ministro Teori Zavaski, por seu turno, votou no seguinte sentido:
“11. Ante o que se vem de expor, manifesto-me no sentido de que:
(a) Sejam as ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621 conhecidas como ações de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental;
(b) Sejam julgadas procedentes, na integralidade, as arguições decorrentes da conversão das ADIs 2028 e 2036, nos limites postos no voto do Ministro Relator;
(c) Sejam julgadas procedentes em parte as arguições decorrentes da conversão das ADIs 2228 e 2621, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 2º, IV; 3º, VI, §§ 1º e 4º, parágrafo único, todos do Decreto 2.536/1998, assim como dos arts. 1º IV; 2º, IV e §§ 1º e 3º; 7º, § 4º, do Decreto 752/1993;
(d) Seja negado provimento ao RE 566.622; e
(e) Caso se confirme, nos demais pontos, diferentemente do aqui sustentado, a orientação adotada no voto do Ministro Relator, que a declaração de inconstitucionalidade do art. 55. II, da Lei 8.212/1991 (na redação que lhe foi conferida tanto pela Lei 9.429/1996 quanto pela MP 2.187/2001), bem como do art. 9º, § 3º; e 18, III e IV, da Lei 8.742/1993 (na redação que lhes foi conferida pela MP 2.187/2001), seja formalizada sem pronúncia de nulidade pelo prazo de 24 meses, comunicando-se o parlamento a respeito do que vier a ficar decidido para que delibere aquela instância da maneira que entender conveniente.”
Além da necessidade de se esclarecer exatamente onde se verifica a unanimidade, é importante esclarecer se prevalece a declaração de inconstitucionalidade das alterações ao art. 55 da Lei nº 8.212/91 ou, além delas o próprio art. 55, seja em sua versão original, seja em sua versão derivada das referidas alterações, pois, como se viu, os votos de Barbosa e Zavaski são diferentes neste aspecto.
Outro ponto que necessita esclarecimento diz respeito ao alcance das inconstitucionalidades declaradas. O saudoso Ministro Teori Zavaski teve esta preocupação quando incluiu em seu voto o item “e” da parte dispositiva transcrito acima, mas, neste ponto, a redação do acórdão silenciou.
A declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade a que se referiu o Ministro Teori Zavaski implica em permitir que se operem a suspensão de aplicação da lei e dos processos em curso até que o legislador, dentro de prazo razoável, venha a se manifestar sobre a situação inconstitucional .
Parece-nos, entretanto, que a recomendação de ausência de pronúncia de nulidade por 24 meses, com o devido respeito, acabaria por trazer muito mais insegurança jurídica e instabilidade das relações, tanto nos processos quanto na comunidade de jurisdicionados pelo fato de que o assunto é muito complicado para que o Poder Legislativo discipline o tema sob a pressão do limite temporal. O art. 195, § 7º da Constituição da República reclama regulamentação desde 1988 e o que se viu até o presente momento é uma sucessão de lamentáveis equívocos.
Além disso, a opção pela ausência de pronúncia de nulidade nos moldes defendidos pelo Ministro Teori Zavaski desconsidera que foi deferida medida liminar em 14/07/1999, “SUBMETENDO-A DESDE LOGO AO PLENÁRIO, PARA SUSPENDER A EFICÁCIA DO ART. 1º, NA PARTE EM QUE ALTEROU A REDAÇÃO DO ART. 55, INCISO III, DA LEI Nº 8212/91 E ACRESCENTOU-LHE OS §§ 3º, 4º E 5º, BEM COMO DOS ARTIGOS 4º, 5º E 7º DA LEI Nº 9732, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1998. DÊ-SE CONHECIMENTO AOS REQUERIDOS, SOLICITANDO-SE-LHES AS INFORMAÇÕES DE PRAXE.”
Como se vê, é o entendimento do Ministro Teori Zavaski no ponto, que, com o devido respeito, provoca instabilidade e incerteza.
Diante disto, o entendimento do Ministro Marco Aurélio Mello parece atender às necessidades de promoção da paz social – segurança e estabilidade, quando afirma que enquanto não for editada lei complementar, valem apenas as regras do artigo 14 do Código Tributário Nacional (CTN) para a fruição da imunidade prevista no artigo 195, §7º, CF. E esta possibilidade foi reconhecida pelo próprio Ministro Teori Zavaski que, durante os debates, admitiu tratar-se de hipótese de analogia.
Estes esclarecimentos são fundamentais, pois a tese fixada possui efeitos vinculantes, ou seja, deverá ser observada por todos os Tribunais pátrios, mormente nos processos de outras entidades beneficentes que se encontram aguardando essa definição nas instâncias inferiores.
Além do mais, embora o art. 55 da Lei 8.212/91 já não esteja mais em vigor, por ter sido revogado pela Lei nº 12.101/09, entendemos que a tese fixada pelo STF também possui o condão de afastar as exigências constantes nesta lei ordinária.
É que, como visto, a decisão em referência deixa clara a inconstitucionalidade formal de quaisquer exigências previstas em leis ordinárias que limitam o direito à imunidade das entidades beneficentes de assistência social.
Dessa forma, enquanto o Congresso não editar lei complementar específica regulamentando os requisitos para o gozo do benefício previsto no artigo 195, §7º, CF, será muito mais prudente que fique claro que as exigências a serem atendidas serão as mesmas necessárias para a fruição da imunidade aos impostos relacionadas no art. 14 do Código Tributário Nacional.
Tudo isto adquire maior relevância no contexto atual em que a Câmara dos Deputados põe em risco direitos constitucionalmente concedidos às instituições atuantes no Terceiro Setor com medidas restritivas incorporadas no substitutivo do Projeto de Emenda Constitucional – PEC 287/16.
Com a palavra o Supremo Tribunal Federal.