Síndico em tempos de pandemia – novos desafios e responsabilidades
*Artigo publicado no site da OAB – Subseção Campo Largo
Após concluída uma obra edilícia e com a devida emissão do Habite-se pela Prefeitura, a incorporadora ou administradora (se já contratada), deverão convocar a Assembleia de Instalação do Condomínio, também denominada de Assembleia Inaugural. Essa assembleia tem duas funções principais, que são a aprovação da Convenção do Condomínio e a eleição do síndico, do subsíndico e dos conselheiros, que serão as pessoas responsáveis pela administração do condomínio. Ou seja, é nesse primeiro ato administrativo que nasce a figura do síndico.
É no art. 1.348, do Código Civil, que estão previstas as principais atribuições do síndico, tais como: representar ativa e passivamente o condomínio em todos os seus interesses, seja em juízo ou na esfera administrativa; cumprir e fazer cumprir a convenção e regimento interno; zelar pela conservação e segurança das partes comuns, fiscalizar a prestação dos serviços de interesse do condomínio; prestar contas das receitas e despesas do condomínio em assembleias anuais ou quando exigidas; cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar multas quando necessário.
Além da responsabilidade da administração interna do condomínio e de colocar em prática as regras previstas na Convenção e no Regimento, é atribuição do síndico fiscalizar o cumprimento das obrigações pelos condôminos e moradores, inclusive com a aplicação das medidas e sanções previstas pela assembleia. O Síndico tem a obrigação de zelar pela manutenção da ordem e segurança dentro do condomínio.
Entretanto, em virtude da pandemia ora vivenciada e notória mudança do cotidiano da população, o momento é de resignificação quanto ao convívio, devendo os moradores em condomínio assumirem novas e imperiosas responsabilidades perante os outros, principalmente em atenção às práticas de saúde e solidariedade social. A pandemia tem ensejado o aumento no dever obrigacional de cada participante da comunidade condominial, principalmente o dever de não prejudicar a saúde dos demais.
Justamente neste momento surgem novos desafios para os síndicos no tocante à preservação da saúde e prevenção do contágio dos condôminos, moradores e colaboradores. Mais do que nunca, a convivência deve ser regulada a fim de garantir o interesse e segurança de todos aqueles que residem ou circulam pelo condomínio.
A fim de preservar e garantir a saúde coletiva da comunidade condominial o síndico está sendo obrigado a tomar medidas emergenciais e por vezes polêmicas de controle de circulação de pessoas e restrição do uso das áreas comuns. Alguns autores chegam a defender que em virtude do período da pandemia o síndico pode-se valer, inclusive, de medidas equivalentes ao poder de polícia.
Entretanto vale lembrar que o condomínio não é administrado de maneira isolada pelo síndico, uma vez que ele precisa colocar em prática e fazer respeitar as normas determinadas pela Convenção e Regimento Interno, que são um conjunto de “regras” criadas com fulcro na legislação vigente e principalmente que refletem a vontade dos condôminos, visando uma melhor convivência dentro do condomínio. Destaca-se ainda, que em se tratando do uso de área comum a competência para criar regras é da assembleia, conforme melhor inteligência do art. 1.351, do Código Civil, cabendo ao síndico executar e fiscalizar suas determinações.
Não obstante, no atual momento vivenciado de proliferação descontrolada do Coronavírus SARS-CoV-2, é atribuição do síndico mover meios e criar ações para preservar a saúde e segurança de toda a comunidade condominial, inclusive motivando os moradores para que mantenham boas práticas de prevenção e controle da doença.
Entretanto, caso o síndico esteja agindo de maneira a extrapolar seus limites e atribuições, em flagrante abuso de direito, poderá, além de ser destituído, nos termos do art. 1.349, do Código Civil, responder civil e criminalmente pelos atos que ultrapassaram os mandos de sua função.
A fim de evitar maiores conflitos com os condôminos e moradores, é prudente que o síndico convoque uma assembleia geral extraordinária, de caráter emergencial, para deliberar quais as medidas de proteção à saúde da comunidade condominial deverão ser tomadas, principalmente pelo fato de que estará em pauta restrições do uso de área comum e limitações e/ou proibições quanto a circulação de pessoas, sendo eles condôminos, moradores, colaboradores e visitantes.
Entretanto a atuação do síndico e da comunidade condominial, tratando-se do momento de pandemia, deve pautar-se à luz dos atos do Poder Público, de modo a respeitar as Leis e Decretos expedidos pelo Governo Federal, Estados e Municípios que tratam das medidas de segurança à saúde e prevenção do contágio pelo COVID-19, e ainda, manter-se atualizado quanto às orientações da ANVISA E OMS.
Segundo o Decreto 520/2021, de 9 de maio de 2021, expedido pela Prefeitura Municipal de Curitiba, que dispõe sobre medidas restritivas a atividades e serviços para enfrentamento e controle da pandemia causada pelo contágio do Coronavírus, há ordem expressa de proibição de reuniões com aglomeração de pessoas, incluindo eventos, comemorações, assembleias, confraternizações e encontros familiares em espaços de uso público localizados em bens privados. Prevê ainda, o Decreto Municipal, restrição à utilização de espaços de práticas de atividades esportivas coletivas localizados em praças e demais bens públicos ou privados, inclusive, estendendo-se a vedação aos condomínios.
Logo, em consonância com o Decreto 520/2021, reside a obrigação do síndico em estabelecer novas normas para utilização das áreas comuns, no caso restringindo o uso e acesso das áreas coletivas como salão de festa, churrasqueira, quadras de esportes, parquinhos, piscina, etc, sob pena de ser responsabilizado civil e criminalmente pela sua omissão.
É certo que o síndico deve agir em consonância com estágio da evolução da pandemia, devendo estar atento aos boletins do avanço do contágio expedidos periodicamente pelos Órgãos Públicos, buscando em suas ações compor a menor limitação possível com a máxima eficiência para evitar o contágio pelo COVID-19, garantindo, assim, maior segurança e proteção à saúde coletiva.
Nessa senda, os atos do síndico devem ser sopesados, sendo que não parece viável a proibição de entrada de visitas nas unidades privadas, quando não há momento de restrição extrema imposta pelo Poder Público. Da mesma forma sem que haja restrição pelo Poder Público, obstar totalmente a utilização de áreas comuns pode ser um ato excessivo, podendo o síndico, regulamentar o uso, como exemplo, permitir que o uso de determinada área comum seja dividido temporariamente por bloco, unidade familiar.
Para controle do contágio da doença e proteção da saúde no ambiente condominial não basta apenas atitudes por parte do síndico. Cada participante da comunidade condominial tem papel importante no combate ao COVID-19, devendo manter as práticas de uso de máscaras em todos locais de convívio comum, higienização das mãos e isolamento social, quando possível. Inclusive é dever do morador informar ao síndico eventual contaminação pela COVID-19, sendo ele o infectado ou não.
O síndico, ao tomar conhecimento da existência da contaminação pelo coronavírus por morador do condomínio, tem a obrigação de mover as medidas de segurança e sanitização necessárias para evitar contágio e proliferação da doença, a fim de garantir a proteção à saúde de todos moradores e colaboradores, sob pena de poder ser responsabilizado civil e criminalmente por eventual omissão ao enfrentamento da COVID-19.
Ainda, caso o síndico tome conhecimento de que um morador contaminado pelo coranavírus não esteja realizando o devido isolamento, pelo período de sua quarentena, colocando em risco iminente não só os seus vizinhos como toda a sociedade, poderá comunicar tal fato à autoridade policial, sendo que é crime contra a saúde pública propagar doenças e descumprir determinações do Poder Público, conforme inteligência dos arts. 267 e 268, do Código Penal.
As relações interpessoais dentro do condomínio nunca estiveram tão reguladas e regulamentadas, sendo esse o novo e grande desafio do síndico, manter a ordem e segurança de todos os moradores e colaboradores.
Os condomínios por sua natureza são grandes aglomeradores de pessoas. Porém, em tempo de pandemia evitar as aglomerações é uma das mais difíceis tarefas para o síndico, além de ter que executar e fiscalizar diariamente, demais medidas diretas de sanitização dos ambientes.
Neste diapasão, o síndico, investido na obrigação de proteção à segurança a saúde dos moradores, tem a obrigação de mover os meios de controle da proliferação e contágio pelo coronavírus, devendo os seus atos serem equilibrados e coerentes a fim de que não seja conhecido como o “xerifão” do condomínio, sendo que poderá responder administrativa, civil e criminalmente se agir com excessos, em abuso de direito ou ainda, caso venha a desrespeitar determinações impostas pelo Poder Público.
Conclui-se que o ideal é que o síndico convoque a assembleia geral extraordinária, em caráter emergencial, a qual, inclusive, poderá ser realizada em meio virtual, para juntamente com a Diretoria e demais condôminos, possam discutir as regras, restrições e penalidades que regulamentaram a convivência dentro dos limites do condomínio, enquanto perdurar a pandemia pela COVID-19.
Lembrando que, sendo o síndico responsável por adotar medidas restritivas, aumentando a fiscalização e vigilância sobre a circulação de pessoas e visando garantir a defesa do interesse comum, também possui poderes para atuar isoladamente para a proteção da saúde da coletividade, mas desde que não haja com excessos.
Fábio Roberto Portella
Advogado inscrito na OAB/PR sob o nº 44.091; graduado pela Universidade Positivo, especializado em Direito Civil e Empresarial pela PUC/PR; Conselheiro da OAB Subseção Campo Largo.