A INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DE BOLSAS DE ESTUDO PARA FINS DE RECONHECIMENTO DA IMUNIDADE – INEXIGIBILIDADE DO CEBAS.

No passado dia 20/03/2020, o Supremo Tribunal Federal, por seu plenário virtual, iniciou o julgamento da ADI nº 4480, cujo objeto é o reconhecimento e declaração da inconstitucionalidade de partes da Lei nº 12.101/09, que dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social; regula os procedimentos de “isenção” de contribuições para a seguridade social; altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993; revoga dispositivos das Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 9.429, de 26 de dezembro de 1996, 9.732, de 11 de dezembro de 1998, 10.684, de 30 de maio de 2003, e da Medida Provisória no 2.187-13, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.

Considerando o julgamento das ADI’s 2028, 2036 e do Recurso Extraordinário nº 566622, no qual ficou assentado que “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas” (tema 32 da Repercussão Geral), não se esperava outra manifestação do STF que não fosse a procedência total ou parcial da ADI 4480.

Muito embora o julgamento ainda não tenha terminado, já se pode saber que o Ministro Gilmar Mendes, relator, votou no sentido de julgar parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade formal do art. 13, III, §1º, I e II, §§ 3º e 4º, I e II, §§ 5º, 6º e 7º; do art. 14, §§ 1º e 2º; do art. 18, caput e do art. 31º da Lei 12.101/2009[1], com a redação dada pela Lei 12.868/2013, e declarar a inconstitucionalidade material do art. 32, § 1º, da Lei 12.101/2009[2].

Por imperativo de coerência com o que ficou estabelecido no tema 32 da Repercussão Geral, a tendência é que o voto do relator prevaleça.

Assim, a exigência de concessão anual bolsas de estudo na proporção de 1 (uma) bolsa de estudo integral para cada 5 (cinco) alunos pagantes como condição para a concessão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social possivelmente será declarada inconstitucional.

O mesmo ocorrerá com a exigência de bolsas de estudo parciais de no mínimo, 1 (uma) bolsa de estudo integral para cada 9 (nove) alunos pagantes; e de bolsas de estudo parciais de 50% (cinquenta por cento), quando necessário para o alcance do número mínimo exigido, bem como a exigência alternativa de projetos e atividades para a garantia da educação em tempo integral para alunos matriculados na educação básica em escolas públicas.

Para a certificação das entidades de assistência social, até que se edite lei complementar, não será exigida a prestação de serviços ou a realização de ações socioassistenciais, de forma gratuita, continuada e planejada, para os usuários e para quem deles necessitar.

Além disso, não se limitará o exercício do direito à imunidade das contribuições sociais somente a contar da data da publicação da concessão de sua certificação.

Tampouco a Secretaria da Receita Federal do Brasil poderá lavrar qualquer instrumento administrativo tendente a exigir contribuições sociais por descumprimento das exigências referidas acima.

Neste caso, a Autoridade Administrativa corre o risco de incidir, em tese, no crime de excesso de exação referido no § 1º do art. 316 do Código Penal Brasileiro. O crime de excesso de exação ocorre “se o funcionário público exige tributo ou contribuição que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza”.

Resta-nos aguardar o final do julgamento.

 

Mauro Júnior Seraphim

Advogado, graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, estudou Ciências Jurídico Políticas (Direito Constitucional, Direito Internacional Público e Direito Comunitário Econômico) na Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa,  Portugal. Estudou Direito Empresarial no Centro Universitário Unicuritiba, Direito Tributário na PUCPR. Especialista em Direito Médico no Unicuritiba e Gerência de Projetos no ISAE/FGV. Atuação profissional voltada para questões do 3º  Setor, Saúde (Direito Médico e Hospitalar) e Educacional.

Desde 2004, como procurador Juridico da Associação Paranaense de Curitiba (PUC/PR), atuou diretamente no Hospital Universitário Cajurú, Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, Hospital e Maternidade Alto Maracanã, Hospital Nossa Senhora da Luz, Hospital Marcelino Champagnat. Membro do GT legal regulatório, na Associação Nacional dos Hospitais Privados. Membro do GT de discussão do Plano Nacional de Educação PNE, na União Marista do Brasil.

 

[1] Art. 13.  Para fins de concessão ou renovação da certificação, a entidade de educação que atua nas diferentes etapas e modalidades da educação básica, regular e presencial, deverá: (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

III – conceder anualmente bolsas de estudo na proporção de 1 (uma) bolsa de estudo integral para cada 5 (cinco) alunos pagantes.        (Incluído pela Lei nº 12.868, de 2013)

  • 1o  Para o cumprimento da proporção descrita no inciso III do caput, a entidade poderá oferecer bolsas de estudo parciais, observadas as seguintes condições:         (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

I – no mínimo, 1 (uma) bolsa de estudo integral para cada 9 (nove) alunos pagantes; e          (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

II – bolsas de estudo parciais de 50% (cinquenta por cento), quando necessário para o alcance do número mínimo exigido, conforme definido em regulamento;            (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

  • 3o  Admite-se o cumprimento do percentual disposto no § 2o com projetos e atividades para a garantia da educação em tempo integral para alunos matriculados na educação básica em escolas públicas, desde que em articulação com as respectivas instituições públicas de ensino, na forma definida pelo Ministério da Educação.           (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)
  • 4o  Para fins do cumprimento da proporção de que trata o inciso III do caput:         (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

I – cada bolsa de estudo integral concedida a aluno com deficiência, assim declarado ao Censo da Educação Básica, equivalerá a 1,2 (um inteiro e dois décimos) do valor da bolsa de estudo integral; e             (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

II – cada bolsa de estudo integral concedida a aluno matriculado na educação básica em tempo integral equivalerá a 1,4 (um inteiro e quatro décimos) do valor da bolsa de estudo integral;          (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)

  • 5o  As equivalências previstas nos incisos I e II do § 4o não poderão ser cumulativas.         (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)
  • 6o  Considera-se, para fins do disposto nos §§ 3o e 4o, educação básica em tempo integral a jornada escolar com duração igual ou superior a 7 (sete) horas diárias, durante todo o período letivo, e compreende tanto o tempo em que o aluno permanece na escola como aquele em que exerce atividades escolares em outros espaços educacionais, conforme definido pelo Ministério da Educação.           (Redação dada pela Lei nº 12.868, de 2013)
  • 7o  As entidades de educação que prestam serviços integralmente gratuitos deverão garantir a observância da proporção de, no mínimo, 1 (um) aluno cuja renda familiar mensal per capita não exceda o valor de um salário-mínimo e meio para cada 5 (cinco) alunos matriculados.          (Incluído pela Lei nº 12.868, de 2013)

 

[2] Art. 32.  Constatado o descumprimento pela entidade dos requisitos indicados na Seção I deste Capítulo, a fiscalização da Secretaria da Receita Federal do Brasil lavrará o auto de infração relativo ao período correspondente e relatará os fatos que demonstram o não atendimento de tais requisitos para o gozo da isenção.

  • 1o Considerar-se-á automaticamente suspenso o direito à isenção das contribuições referidas no art. 31 durante o período em que se constatar o descumprimento de requisito na forma deste artigo, devendo o lançamento correspondente ter como termo inicial a data da ocorrência da infração que lhe deu causa.

 

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